Assim como os milhares de brasileiros foram à Serra Pelada nos anos 80 em busca de dinheiro e glória, a produção do longa de mesmo nome fez de tudo para criar um clássico nacional, mas infelizmente naufragou na tentativa. O principal problema do longa está exatamente neste objetivo vazio: a vontade de criar um grande épico brasileiro em vez de se contar uma boa história.

O filme bebe claramente em Scorsese, Leone e Coppola. Todas as regrinhas e os clichês de narrativas do gênero gângster foram colocados em um liquidificador de onde se tirou o roteiro deste filme. Mas seguir formulinhas não basta para se fazer um épico. Ele precisa, acima de tudo, de alma.

Heitor Dhalia, dos ótimos “Cheiro do Ralo” e “À Deriva” e do fraco “Nina”, escolheu bem o pano de fundo para seu épico. O cenário e todo o imaginário que cercam Serra Pelada são perfeitos para uma história sobre poder corrompendo o homem e suas amizades.  Mas só isso não basta.

A repetição de truques e ideias de filmes do gênero surge na tela em quase todos os momentos. Por exemplo, a cena do almoço na praia intercalada com o assassinato de vários personagens é uma referência claríssima – e, por isso, irritante – à sequência do batismo intercalado de mortes no Poderoso Chefão de Coppola.

A escolha e, principalmente, a construção dos personagens, não foi feliz. Juliano (Juliano Cazaré) e o Professor (Júlio Andrade) não nascem nem se desenvolvem na tela, aos olhos do espectador. Pelo contrário, eles são apenas peças que repetem clichês. “Esse lugar piora a gente”, eles falam logo no começo do filme, para repetir mais perto do final. Espera um pouco, nem o filme havia mostrado nada que comprovasse isso nem os personagens haviam vivenciado momentos que justificassem esse pessimismo.

As transformações dos personagens ocorrem de forma rápida e atropelada, sem alma e sem credibilidade. Juliano se transforma em um assassino frio em poucos segundos. Assim como volta a amar o amigo com um simples aperto de mão.

A superficialidade reina em absolutamente tudo. O retrato dos gays, o coronel vivido por Matheus Natchergaele, a ex-prostituta que arrebata o coração de Juliano, os golpes e contragolpes entre gângsters, o arrependimento do anti-herói etc.

A desnecessária e didática narração em off também incomoda. Muitas vezes, ela nada mais é que uma legenda da imagem no pior estilo Folha de S.Paulo.

Dito isso tudo, vale ressaltar que não estamos diante de uma bomba. O cinema já proporcionou escorregadas muito maiores. Mas também não se trata de um bom filme. Uma pena, a atmosfera de Serra Pelada tinha tudo para gerar uma bela história.