Um Rei amado e respeitado, dono de terras pequenas, porém férteis, que conseguiam produzir pouco, mas valorizado artesanato. Para ele havia um problema. Achava que faltava liderança naquele reino. Queria um primeiro-ministro que tocasse o dia-a-dia. Que respeitasse os súditos e que fosse respeitado pelos outros reinos. Achava que faltava maturidade e conhecimento para o capataz que cuidava daquelas terras. Queria alguém que motivasse e incentivasse. Na verdade, ele não via que tinha tudo isso nas mãos dele. O problema eram alguns ministros que o cercavam, envenenando com mentiras e exageros. Cego, acabou contratando alguém que era exatamente o oposto de tudo aquilo que ele queria. Orgulhoso, não escutou as críticas da plebe. Arrasado, viu um a um deixar o reino. Que ficou ali, com terras secas e pastos vazios. O Rei trouxe novos súditos de terras arrasadas pelas queimadas e pela fome, mas estes já não eram como os anteriores. Vinham pela necessidade, não por amor ao reino. Vinham por não ter opção melhor, não por escolha. Naquela noite, o Rei se sentou no trono e viu aquele salão escuro e vazio. Apenas a luz da Lua ousava invadir seus muros pelos vitrais avermelhados. As ruas traziam os poucos sons de uma cidadela adormecida. Um reino que se acomodava em suas camas. Foi ali, com o cotovelo no trono e mão no queixo, que ele fechou os olhos e percebeu que já não havia mais opção. Era um rei, sim. Mas deposto por seu verdadeiro povo. Que mantinha na cabeça uma coroa enferrujada. Que segurava um cetro amassado e curvo. Que já não recebia cartas de outros reinos. Que já não via barcos atracarem no porto. Nem carroças cruzarem as estradas. Estava cercado por ministros foliões, de maquiagem borrada e taças de vinho nas mãos. Que organizavam festas regadas a vinhos e frutas, enquanto os olhos da plebe ferviam por trás das muralhas, cavando a terra em busca de sementes e escaneando os céus pela piedade dos Deuses.