Que o brasileiro tem complexo de vira-latas, Nelson Rodrigues já falou há muito tempo. Mas não é que neste ano tivemos de ouvir e ler várias personalidades se posicionando contra o evento? Seja pela falta d’água, seja pela caretice, neste 2015 os contras ganharam muito espaço na mída. Espaço demais, diga-se.

 

Mas, vamos lá: o Carnaval é um patrimônio cultural brasileiro. Gera um dinheiro absurdo em diversos pontos do país. Talvez seja uma das principais fontes de renda de cidades como Rio de Janeiro, Salvador, Ouro Preto e Recife. Se não querem enaltecer o Carnaval por seu valor cultural, que seja por sua importância na economia nacional.

 

Como publicitário, sei das enormes oportunidades que o evento proporciona pelo país afora. De pacotes de mídia a ativações pontuais, vemos um tsunami de marcas investindo pesado em campanhas com confete e serpentina. E não faltam oportunidades distintas: o axé da Bahia, o Galo da Madrugada no Recife, a Sapucaí carioca, o Anhembi paulistano, as marchinhas de Paraitinga, as ruelas de Ouro Preto, os bailes nos clubes do interior e, mais recentemente, os blocos de rua.

 

Convenhamos, é lindo demais ver o povo nas ruas, fantasiado, sambando e cantando a alegria de viver. Eu, particularmente, tenho minha preferência pelos Carnavais do Rio de Janeiro e de Salvador. Além de explosões culturais, são momentos de pura felicidade, que fazem o ano recomeçar de uma maneira mais feliz e motivada.

 

Por isso fico bastante otimista com as notícias de que os blocos de rua – antes quase uma propriedade carioca – terem arrastado milhões por Brasília, Belo Horizonte e nossa triste (?) São Paulo. Nossa capital paulista vem nos últimos anos se empenhando bastante em trazer de volta seus cidadãos para as ruas, com eventos como a Virada Cultural, o SP Na Rua e festas que pipocam por praças do centro quase todo final de semana. Neste ano, o número de blocos paulistanos superou o dos dois últimos anos somados. Não é pouca coisa.

 

O que o Carnaval proporciona é algo que o brasileiro precisa resgatar na maioria de suas cidades: a ocupação do espaço urbano. A escalada da violência nos anos 80 e a divisão social tiraram muita gente das ruas. Valetes, grades e portões criaram grotões em cidades como São Paulo. O que é péssimo para a vida das pessoas. O que queremos e precisamos é de gente nas calçadas, praças, bares e mercadinhos. Gente circulando, consumindo e interagindo com o espaço público. É assim, aliás, que a população consegue apontar defeitos e problemas na infra-estrutura das cidades, como calçadas esburacadas, falta de banheiro público, metrôs superlotados, linhas de ônibus mal distribuídas etc.

 

Claro que há problemas pontuais, como xixi na rua, lixo acumulado e trânsito. Mas é Carnaval. E uma aglomeração de milhares de pessoas, claro, sempre tem algum ônus. Mas os ganhos são infinitamente superiores a eles.

 

Então, por mais que muita gente veja um problema nesse feriado tão longo, dizendo atrapalhar a economia, vale a pena ver o quanto este turismo gera renda e, principalmente, o quanto faz bem para as pessoas voltarem a interagir com as cidades e viver momentos de alegria e diversão. Se o brasileiro vira-latas adora se comparar com povos mais desenvolvidos – o que é um erro – por quê não olha lá para fora e vê o exemplo de festas como a do Ano Novo Chinês?

 

Nós brasileiros temos de valorizar o que é nosso e o que nos faz bem. Precisamos botar o bloco na rua e aproveitar cada minuto livre que temos no Carnaval. Afinal, cada vez mais, nossas horas de lazer são raras. E de que adianta viver sem um pouco de prazer?