Como é fácil odiar São Paulo. Colocar na falta de praia e na feiura da paisagem a culpa pelo nosso fracasso como civilização. Dizer que em Miami as ruas não são esburacadas como as nossas, que as calçadas de Nova York não são estreitas como estas e que o Centro de Londres não é abandonado como o daqui. É muito fácil.

 

Como é fácil dizer que não andamos de ônibus porque o serviço daqui é péssimo. Que bom mesmo é o Metrô de Paris. E que só quando igualarmos a quantidade de linhas parisienses deixaremos o carro em casa.

 

Como é fácil defender que ciclovia é só para cidades planas, sem nunca termos pedalado nos hills de Sydney. Que multa é pra político ganhar dinheiro, enquanto fazemos conversões proibidas e paramos em fila dupla. Que o rio está fodido mesmo, então por que não aterrar logo?

 

É fácil odiar São Paulo sem nunca ter pisado no MASP. Sem nem ter ouvido falar da Trackers e dessas casas de nomes diferentes, como da Luz, do Povo e Amarela. Sem nunca ter feito um pic-nic no Sesc Interlagos. Na real, sem nunca ter ido ao Sesc Interlagos.

 

É fácil odiar sem nunca ter usado a Paulista para uma caminhada de domingo à tarde. Ou só ter usado o Ibirapuera num show gratuito que a galera combinou. É fácil odiar quando só se usa o Centro para comprar um eletrônico na Santa Ifigênia.

 

É muito fácil. Principalmente quando se está preso num aquário de vidro ou de concreto. Quando a cidade que você vê é sempre através de uma janela fechada por segurança. Quando a cidade que você vive é apenas naquela caminhada na hora do almoço de um dia útil.

 

É fácil odiar qualquer cidade quando se é paulistano. Não é ele que odeia o Rio de Janeiro? Que só aproveita Salvador de dentro das cordas de um bloco? Que conhece o Brasil de dentro da cabine de um avião ou do quarto de um hotel?

 

Porque o paulistano não passeia, afinal isso é coisa de vagabundo. Não deita na grama de qualquer parque ou praça, só na do Hyde Park. Não senta no banco enquanto toma um sorvete, a não ser que seja na High Line.

 

Paulistano que é paulistano alimenta o ódio. Senta a mão na buzina e xinga a Dona Maria ao volante. Joga lixo no chão porque ninguém limpa mesmo. Entra na contra-mão porque o trânsito é uma merda, que culpa ele tem?

 

Paulistano odeia o Borba Gato porque ele é feio, não porque foi um assassino. Sabe que Bandeirantes é uma avenida e uma estrada, não um bando de assaltantes genocidas.

 

Mas não pense que paulistano é só rancor e ódio. Ele ama valet na porta do restaurante. Estacionamento? Só se for na mesma quadra do bar. Porque andar não é humano. Não é digno. Não condiz com o sucesso profissional e financeiro.

 

Taí outra coisa que ele adora, finanças. Paulistano gosta de gastar. De pagar bem mais caro para estar entre os seus. Não quer essa gente diferenciada que a estação de Metrô traz. Mesmo tendo milhares de opções gratuitas ou baratas de diversão na cidade. Claro que não há a democracia de uma praia, mas a lista de opções está cada vez maior.

 

Mas o amor mesmo do paulistano é pelo concreto. Veja as estações do Metrô. As praças. Nosso cartão postal estaiado. Tudo é acinzentado. Até os terminais antigos de Cumbica são cheios dele. Símbolo do progesso e do futuro.

 

Claro que num ambiente desses, cercado por essas pessoas, é sempre mais fácil odiar São Paulo.