Em “Califórnia”, Marina Person perde a virgindade como diretora de longas de ficção. E nos convida a embarcar em uma série de outras perdas de virgindade que fazem parte do amadurecimento que todos passamos na adolescência.

O primeiro beijo, a primeira paixão, o primeiro sexo, a primeira perda, a primeira doença em família, a primeira banda, o primeiro porre, a primeira viagem entre amigos. “Califórnia” reúne uma série de desabrochares.

A princípio, achamos que Marina está falando de si mesma. Afinal, a atriz Clara Gallo (Teca) remete fisicamente à diretora e todo o universo do filme gira em torno da cultura pop dos anos 80 – em especial da música – que fez a carreira de Marina como VJ da MTV. A emissora é inclusive citada na história. Mas não se engane. É claro que ela incluiu momentos e situações que viveu, mas na verdade, Teca, a personagem principal, é retrato de toda uma geração. Eu que tinha apenas 4 anos no período em que a história se passa me identifiquei com quase tudo. Desde os brinquedos, livros, as idolatrias a filmes e bandas, o mistério da AIDS, tudo fez parte de minha vida. E ao longo do filme isso vai ficando bem claro: Teca é mais uma entre milhões. É Marina, sou eu, é você.

E é isso que torna a obra tão sensível e melancólica para quem viveu os anos 80. Com elegância e respeito, Marina nos leva a rever momentos que vivemos ou que queríamos tanto ter vivido na época, com a trilha sonora que fez parte de nossas vidas.

Uma pena que o filme se perca em suas próprias criações. Os personagens Carlos (Caio Blat, perfeito) e JM (Caio Horowicz, fiquem de olho nele) são fortíssimos e muito bem construídos, mas acabam perdidos e subaproveitados na história. O roteiro prefere o clichê e a superficialidade para ambos. Mesmo caminho escolhido para o pai de Teca, ironicamente vivido pelo Titã Paulo Miklos, o estereótipo do pai dos anos 80. Sim, a obra lidao tempo todo no pano de fundo com estereótipos culturais, mas a magia seria deixar isso de lado na hora de lidar com os personagens. A grandiosidade do longa viria daí. Mas nada disso tira a beleza do filme. São imperfeições comuns quando se tenta fazer uma obra sem medo.

“Califórnia” vale a pena e merece ser visto. Nem que seja para toda essa gente que não entendeu a comoção pela morte de Bowie. O filme, produzido muito antes do falecimento dele, deixa muito clara a grandiosidade deste ícone para diferentes gerações e para a cultura pop.