“Trumbo” é um filme político. Talvez por isso esteja sendo tão ignorado pela mídia, mesmo com uma merecida indicação ao Oscar de Melhor Ator para Bryan Cranston, que com esta conquista finalmente vira a página de “Breaking Bad”.
O longa é sobre apenas um dos vários períodos negros da história norte-americana – tão ignorantemente idolatrada por uma grande parcela de brasileiros. Se o recente “Selma” focava na segregação dos negros, “Trumbo” foca na perseguição aos esquerdistas. O longa conta a história de um dos roteiristas mais talentosos que Hollywood já teve, Dalton Trumbo, que acabou perseguido na maior parte de sua carreira por ser membro do Partido Comunista. Ele ganhou dois Oscars mas nunca pôde subir ao palco para recebê-los. Um foi creditado a outro roteirista e, o segundo, a um pseudônimo.
É daqueles filmes baseados em fatos reais que nos deixam em dúvida se situações tão ridículas e absurdas como as que o longa mostra realmente aconteceram. Sim, aconteceram. Assim como é absurdo pensar hoje na escravidão ou no nazismo, deveria ser relembrar a ridícula perseguição aos comunistas, com a maldita Lista Negra que proibiu aqueles que nela constavam de trabalhar .
Como o filme mostra, famílias e carreiras foram destruídas por uma besteira conservadora. Pessoas se suicidaram e morreram doentes por lhes terem sido tiradas o direito à cidadania. O direito de trabalhar e, assim, de fazer parte da sociedade.
Mas o que mais assusta é o claro paralelo com os dias de hoje, principalmente no Brasil. Lá no fim dos anos 40, um conservador John Wayne, bradava raivoso: “Vá embora e vá ver o Balé de Bolshoi (na Rússia)” como muitos bradam “Vá para Cuba” na Paulista. O então ator Ronald Reagan – que viria a ser presidente pelo conservador Partido Republicano – verbaliza de forma ainda mais parecida: “Enviaria todos para a Rússia”.
Temos a colunista de direita, Hedda Hopper, capaz de denigrir biografias e destruir carreiras enquanto é ovacionada pela grande mídia – no caso, Hopper vira capa da Time.
Temos tribunais e depoimentos midiáticos, transformados em verdadeiros espetáculos para um público que é informado de forma bastante superficial sobre os reais fatos em discussão.
Temos acusados humilhados em público, por cidadãos que entram na onda superficial e difamadora da mídia e que aderem à violência embalados por um movimento de caça às bruxas.
Há críticas ao que hoje alguns chamam de esquerda caviar: pessoas sensíveis às causas de esquerda mas que têm dinheiro. O personagem Trumbo, então o roteirista mais bem pago do mundo, é confrontado sobre isso. Como pode lutar pelos direitos trabalhistas se é riquíssimo? Ele explica que não quer perder tudo o que conquistou, claro, mas que está disposto a correr o risco. “Por que diretores, roteiristas e produtores podem ganhar muito dinheiro enquanto outros membros da equipe de filmagem são mal pagos?”
Temos ali a imprensa e setores da sociedade fazendo pressão sobre empresários – no caso, executivos dos estúdios de cinema. Temos os direitistas, de discurso ético e de amor à pátria, envolvidos em corrupções mais verdadeiras que os acusações que as vítimas deles sofrem. Vemos e sentimos a humilhação que muitos passaram por nada. Apenas pelo conservadorismo ignorante e pelo medo controlador.
“Há muitas pessoas zangadas e ignorantes no mundo”, diz Trumbo, nos fazendo lembrar dos atuais fanáticos religiosos, da bancada evangélica do Congresso, do machismo do dia a dia, do preconceito racial nas telas de TV, da não aceitação dos diferentes gêneros, do conservadorismo egoísta…
Vemos ali a direita, sem bons argumentos, partir para a violência. Psicológica e física, como nos dias de hoje. Lembro dos raivosos que vestem camisas da CBF, xingando, conclamando a morte da democracia, a perseguição a setores políticos, tirando foto ao lado de uma instituição violenta como a PM, e penso se essa gente nunca estudou na escola. Daí recordo que nosso sistema de ensino é feito para se passar no vestibular – e, assim, entrar na faculdade para ingressar no seleto grupo de diplomados da sociedade brasileira.
Sabemos que conhecer a história é entender o mundo. Mas mais do que isso, é impedir que injustiças e absurdos do passado se repitam. O brasileiro deveria correr para as salas de cinema e ver este filme. Vale a pena refletir.