Ué, como todo mundo, respondi. Por mais que eu já fizesse análise com ele há muitos anos, achei que fosse uma curiosidade, não parte do tratamento. 

Meu psicólogo é um senhor que se divide entre fazer o trabalho pelo qual eu pago e se divertir com as histórias que eu conto. O jantar dele em família deve ser recheado dos meus relatos.

Ele quis saber detalhes. Na hora, lembrei daquele argentino junguiano com o qual não me dei nada bem, principalmente porque o pagamento era feito em dinheiro ao final de cada sessão. Estaria meu psicólogo atual sugerindo mudar para aquele sistema? Eu tinha achado aquilo super frio e capitalista, quebrava aquele alívio de fim de sessão que eu conquistava depois de me abrir e vomitar aquele chororô todo que a gente despeja. Você sabe.

Não, ele queria detalhes e estava pronto para anotar. Expliquei. Pego o dinheiro que me entregam como troco, ordeno as notas pelo valor e coloco na carteira seguindo essa ordem numérica. Nota de dois, de cinco, de dez e assim por diante. Tudo organizadinho.

Então. E ficou em silêncio. Então o quê, me perguntei enquanto aguardava mais alguma palavra dele. Nada. Então? Não entendi, foi o que eu disse. E ele me contou que nem todo mundo guarda assim. Cada um tem seu método. Tem gente que joga de qualquer jeito, em qualquer ordem. Tem gente que faz questão de deixar tudo amassado. Tem aqueles que dobram todas as cédulas, enquanto outros dobram as de menor valor e deixam as mais valiosas esticadinhas.

Oi? Desordenadas? Umas dobradas e outras não? É, ele me disse. E contou que ele, por exemplo, não guarda nenhuma cédula na carteira. Ali é só para documentos e cartões. O dinheiro fica solto no bolso. Não, não poderia ser verdade. Mas me mostrou. E era.

Então, repetiu, seguido do meu silêncio. Ainda não fazia nenhum sentido para mim. Fiquei olhando para o bolso dele, imaginando aquelas notas todas soltas, e foi me dando uma agonia, um desespero mesmo. Até que pedi que ele tirasse o dinheiro do bolso e guardasse na carteira. Em ordem.

Silêncio. Seguiu só me encarando. Pedi que ao menos guardasse na carteira, mesmo que fora de ordem. Nada. Nenhum movimento, nenhuma palavra. Apenas os olhos em mim e a caneta na mão.

Tá, falei, deixa tudo embolado. Amassado. Dobrado. Como quiser. Mas guarda a porra do dinheiro na carteira.

Me olhou mais um pouco. Anotou uma palavra. Apenas uma, não foi um movimento para duas. E sugeriu: acho que devemos aumentar as sessões para duas vezes por semana. Aceitei na hora.